Geralmente, o objectivo do trabalho é baseado em diversos factores, inclusivamente no significado histórico do interior do edifício, no grau de danos ou de degradação da “compo”, e nos objectivos interpretativos globais da execução da obra. Apresentam-se de seguida diversos exemplos de reparação e de substituição destinados a sugerirem objectivos de trabalho típicos incluídos em obras de preservação e de restauro. Os tratamentos são apresentados por ordem hierárquica, desde a menor intervenção até à maior.
Remoção de tinta. Geralmente, a ornamentação interior foi pintada muitas vezes, ao longo da sua vida e, em consequência, os pormenores superficiais nítidos do padrão original ficaram obscurecidos. Antes de se tentar remover a tinta, é sempre aconselhável obter-se uma opinião profissional sobre o material ornamental que vai ser limpo, assim como sobre a natureza dos revestimentos que a recobrem. E seja qual for o objectivo da obra, deve ser preservado pelo menos um exemplo intacto e bem aderente das camadas de tintas sobre um elemento, para futuras investigações históricas.
Baseado no objectivo do tratamento, há algumas perguntas que um conservador coloca, por rotina. Quantas camadas de tinta existem? Será importante assinalar-se uma dessas camadas em relacionamento com uma particular ocupação do edifício? Se assim for, a estratigrafia (ou esquema de camadas) terá que ser determinada antes da remoção da tinta. Depois de ter sido identificada a camada correcta, a cor pode ser afinada. Ou então, o edifício está a ser reabilitado? Se for esse o caso, podem ser apropriadas tintas de cores típicas da época.
Para os propósitos desta Nota e dos parágrafos de orientação seguintes, assume-se que estão a ser removidas todas as camadas de tinta com o objectivo de se revelar a pormenorização fina dos ornamentos em composição.
O próximo passo é considerarem-se os vários métodos para a remoção de tinta do ornamento sem o danificar, ou sem ficarmos expostos às substâncias perigosas existentes nos decapantes, bem como nas próprias tintas antigas!
Deve-se assinalar, sob o ponto de vista da saúde e da segurança, que a maioria da “compo” do período Federal e Império pretendia imitar o mármore: assim, a altamente tóxica tinta branco-de-chumbo era, de longe, o seu revestimento original mais vulgar.
Os decapantes cáusticos à base de soda cáustica devem ser evitados por duas razões.
Primeiro, eles vão quer danificar, quer dissolver a “compo” porque eles “mastigam” a estrutura de proteína da cola e, segundo, porque eles são aquosos e a “compo” é solúvel em água. Se um decapante consegue danificar a proteína das nossas mãos, ele vai fazer o mesmo à “compo”!
Um conservador deverá usar mais habitualmente os solventes orgânicos, tais como o cloreto de metileno, em combinação com pequenas ajudas de uma escova de dentes ou de um instrumento de dentista. (É sempre ensaiada uma pequena área, em primeiro lugar, para se estabelecerem a segurança e a eficácia de qualquer técnica. O uso inadequado de ferramentas de decapar pode Quando este friso em composição decorativa histórica foi erradamente identificado como estuque, e depois tratado com um decapante cáustico, resultou numa secção destruída.
Deve ser chamada a atenção para o facto de que qualquer exposição a químicos tóxicos, sem as devidas precauções, pode provocar severos problemas de saúde. É desejável uma unidade pessoal estanque alimentada com ar fresco quando se utilizam decapantes à base de cloreto de metileno, se não existirem câmaras de pintura ou gabinetes com uma exaustão eficaz para o exterior. As máscaras para vapores orgânicos podem não ser totalmente eficazes na protecção contra a exposição ao cloreto de metileno porque os seus filtros ficam muito rapidamente esgotados; no entanto, uma máscara para gases, com cassetes adequadamente preparadas para solventes orgânicos, pode proporcionar um aceitável nível de segurança, sempre que essas cassetes sejam regularmente trocadas.
Alguns conservadores têm conseguido excelentes resultados decapando a quente as camadas de tinta em excesso, usando pistolas de ar quente e instrumentos dentários. Este trabalho é altamente especializado e o seu sucesso depende de o ornamento em composição ser mais velho do que as camadas de tinta que tem por cima, mas tem a capacidade de, nas mãos de um especialista, resultar tão bem ou melhor do que os métodos químicos. Sempre que esteja envolvida uma remoção de tintas, devem ser tomadas precauções contra os vapores de chumbo.
As misturas de limpeza à base de enzimas também são usadas pelos conservadores. Este é um método eficaz porque as misturas de enzimas podem ser formuladas para finalidades muito específicas (ou seja, para dissolverem apenas as tintas à base de óleo de uma “compo” à base de cola de proteína). Elas dissolvem a tinta sem afectarem o substrato de madeira. Mas, por outro lado, o trabalho pode ser muito lento e a despesa pode apenas ser justificada em objectos importantes, pequenos e raros, ou de museu. Os produtos de limpeza enzimáticos são dependentes de elevados níveis de especialização, de conhecimento técnico e de treino profissional, mas eles estão a merecer um lugar sólido no repertório dos conservadores profissionais.
A crescente preocupação com o ambiente pode muito bem vir a tornar os decapantes à base de cloreto de metileno obsoletos num futuro próximo. Os fabricantes já produziram decapantes “mais seguros” à base de dimetil ésteres, e a investigação futura irá, provavelmente, fazer surgir outras alternativas aos solventes clorados. Os decapantes de acção lenta, do tipo solvente, também podem ser mais seguros para a composição ornamental subjacente, mas são necessárias mais investigação e mais utilização antes de se produzirem avaliações definitivas.
Em resumo, a maioria dos danos que a “compo” sofre acontecem durante a remoção das camadas de tinta; este é um processo crítico e não deve ser tentado sem se consultar um conservador, assim como não deve ser executado por empreiteiros de pintura, a menos que sejam altamente especializados e que tenham tido uma extensiva experiência neste muito delicado procedimento.
O despejo dos resíduos químicos e dos restos deve ser executado de forma a se evitar contaminar o ambiente com os solventes ou com o chumbo, e esse despejo é, de facto, actualmente exigido pelas posturas federais, estaduais e locais. A empresa responsável pela remoção do lixo químico deve ser licenciada para o fazer, de outra forma o proprietário do edifício pode ser responsabilizado se forem violadas as leis sobre o despejo de resíduos.
A seguir à decapagem da “compo”, segue-se habitualmente a aplicação de um novo acabamento. Conforme a evidência histórica revelada e dependendo da aparência existente e desejada para a divisão, a “compo” pode ser colorida, pintada, dourada, marmoreada ou polida. Os tipos de tinta podem incluir a têmpera, o óleo alquídico ou o látex. Recomenda-se uma camada fina para que os intrincados pormenores da superfície não fiquem obstruídos.
Fendilhação superficial. A fendilhação superficial indica idade e, por isso, a história da própria ornamentação. Ela não significa necessariamente que as fendas tenham que ser reparadas. Mas se a fendilhação interferir com o padrão geral do motivo decorativo, então o conservador pode decidir preencher as fissuras com um material de preenchimento adequado. Por exemplo, as massas predoseadas “ligeiras” de reparação acrescentadas com microbalões são excelentes porque são moles e compressíveis e vão acomodar as alterações de tamanho das fendas consequentes da flutuação da humidade. Depois da estabilização, a superfície é acabada para condizer com a área existente.
Delaminação. A delaminação ou separação da “compo” do seu substrato em madeira é o problema de reparação mais simples de tratar. O conservador começa por testar as áreas fendilhadas com uma ligeira pressão do dedo, para determinar quais as partes de desenho que precisam de consolidação. As porções de “compo” que se tiverem separado do seu substrato mas que, por outro lado, estejam intactas, podem voltar a ser coladas no seu lugar com colas do tipo emulsão, tais como as colas “brancas” ou as colas transparentes que libertam solvente. No caso de superfícies verticais, a cola é pintada no verso da “compo” delaminada, assim como na base em madeira, e quando estiver ligeiramente pegajosa, é voltada a assentar e segura com grampos até ficar seca.
Os conservadores profissionais, por vezes, formulam as suas próprias colas à base de polímeros sintéticos (plásticos) dissolvidos em solvente, as quais irão ser mais reversíveis, no caso de essa necessidade aparecer, e que também oferecem uma melhor estabilidade a longo prazo do que as colas comerciais.
Reparações na “compo” partida ou danificada. Quando se perdeu parte da “compo” original, é necessário algum trabalho adicional para se fazer uma reparação. Um método particularmente fácil e barato para se reparar uma ornamentação partida é usar-se uma argila não endurecedora (“plasticina”) ou materiais de modelação à base de polímeros como material de impressão para se fazer um molde. Depois de ser feito um molde a partir do ornamento existente, as porções em falta ou deterioradas do desenho histórico podem ser duplicadas com um estuque de gesso durável. Especialmente em casos onde as considerações económicas ditarem o procedimento, o emprego deste material de substituição pode ser muito útil porque é mais barato. Em alternativa, por vezes, pode ser usado um molde de estúdio existente para se fazerem pequenas peças de substituição numa obra de reparação.
Num outro cenário, um desenho repetitivo de uma frente de lareira pode estar danificado ou ter bocados em falta.
Especialmente se o desenho da “compo” for complexo, e se for necessário substituírem-se diversas porções do ornamento, recomendam-se para este trabalho de reparação moldes rígidos de polímero com “compo” tradicional. O molde é criado usando-se uma porção do ornamento original como modelo. Depois de estarem fabricadas as peças de substituição, elas são assentes com pregos 26 especiais, ou com pregos acabados. A ponta aguçada do prego é cortada com uma turquês para se evitar lascar o substrato de madeira. Primeiro prega-se o prego até à superfície, depois embebe-se a cabeça e o buraco resultante é preenchido com massa de gesso ou com mais “compo”.
Finalmente, pode-se encomendar por catálogo uma peça de substituição, pronta a usar, a um fabricante de “compo”, mas é improvável que esta condiga perfeitamente com uma decoração histórica existente.
Substituição de ornamentação em “compo” desaparecida. Uma “compo” que já foi atractiva, pode ficar danificada até um grau tal que os fragmentos restantes são removidos pelo seu proprietário e toda a superfície é pintada por cima. Assim, se existir alguma ornamentação em “compo” numa divisão, tal como numa moldura de sobre-porta ou de rodacadeira, o conservador, muito provavelmente, irá procurar evidências dos outros ornamentos que desapareceram.
Por exemplo, uma frente de lareira pode aparecer a um observador não treinado como sendo uma superfície lisa sem
ornamentação, mas depois de muitas camadas de tinta terem sido removidas pelo conservador, são reveladas sombras de imagens.
Estas imagens ou “fantasmas” foram deixadas pela componente cola da mistura original. Apesar de a cola ser solúvel em água, ela não vai ser completamente removida por um decapante orgânico tal como o cloreto de metileno. (Mas se foram usados métodos mais antigos e inadequados para a remoção da tinta, tais como os decapantes aquosos, os decapantes cáusticos, ou a lixa, as marcas “fantasma” da cola podem ter sido destruídas).
Quando o decapante de tinta seca, aparece uma marca “fantasma” deixada pelo ornamento em composição, ligeiramente mais escuro do que a área em seu redor onde não estava nenhuma “compo” aplicada. Além disso, os pequenos pregos 27 de 1⁄4” e cabeça quadrada usados para reforçarem a “compo” original podem ter ficado embebidos na madeira.
Em resumo, a evidência física pormenorizada, assim como a documentação escrita e pictórica, pode proporcionar uma base de trabalho válida para a substituição num determinado local. Com algum trabalho cuidadoso de detective, a ornamentação histórica desaparecida pode ser identificada com sucesso e substituída com ornamentos acertados.
Restauro conforme um “período” anterior. Quando a ornamentação estiver extensivamente degradada e em falta, é frequente os proprietários quererem recriar a aparência histórica através do restauro. Podem ser usadas a evidência física e outra documentação como base para o restauro; deve-se recordar, no entanto, que conforme a quantidade de material diminui, maiores são as hipóteses de falta de rigor quando se tenta representar uma aparência histórica. Por isso, a escolha do restauro como tratamento requer uma exacta documentação anterior ao trabalho e uma meticulosa atenção ao pormenor no próprio trabalho.