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Estuque Tradicional de Cal: Mitos, Preconceitos e a Importância da Boa Prática Construtiva

Em anos recentes, as investigações levadas a cabo durante a reparação e o trabalho de restauro conduziram a um significativo aumento do nosso conhecimento sobre as técnicas usadas nos estuques antigos, mas pouco está documentado. Ian Constantinides examina o emprego do estuque tradicional e faz explodir alguns mitos e más concepções vulgares.

Enquanto que o desenvolvimento estilístico do estuque através dos tempos está bem documentado, a história da tecnologia do estuque pré Vitoriano está relativamente pouco investigada. As fontes carecem de pormenores sobre os materiais e métodos de trabalho dos artesãos. O livre bem fundamentado de Millar “Plastering Palin and Decorative” é uma Bíblia para a maioria das pessoas, mas é limitado no que se refere à descrição do estado da arte do estuque de cal, sendo apenas relevante a respeito do trabalho Vitoriano e Eduardino.

Em anos recentes, a nossa compreensão destes trabalhos anteriores aumentou consideravelmente. Enquanto a conservação, reparação e renovação dos estuques históricos ficou esquecida a favor da pedra, ouviram-se contar algumas histórias de terror. Não é necessária um olhar especialmente sensível para se reparar como são desconfortáveis os bem executados, mas uniformemente repetitivos trabalhos de reparação feitos pelos estucadores modernos comparados com o trabalho original, in situ, de um tecto Jacobino primitivo, pelo que a substituição integral do estuque verdadeiro por estuque cartonado é hoje menos comum. Mas é menos evidente como é que a evolução dos materiais e das técnicas podem afectar a integridade estrutural de um trabalho de estuque histórico.

A adição de gesso, por exemplo, que faz presa rapidamente pela adição de água, afecta radicalmente os tempos de trabalho e, consequentemente, o tratamento decorativo, assim como a própria presa. Encontra-se, por vezes, gesso em trabalhos mais modestos bastante antigos e frequentemente ele não está aparente onde seria mais de se esperar.

Foi feito um exemplar para Uppark House em que uma mistura de cal em pasta firme com crina foi vazada em moldes sólidos e libertada enquanto ainda estava verde. Se existir algum gesso nos elementos moldados, ele é tão pouco que não afecta materialmente a presa. Uma vez moldadas, as peças obtidas podem continuar a ser trabalhadas ou aperfeiçoadas manualmente para se acrescentar definição, pormenores enriquecedores, ou concavidades acentuadas e, consequentemente, cada peça moldada é ligeiramente diferente das demais. As fiadas de óvulos e cubos ou de folhagens feitas desta maneira eram frequentemente fixadas enquanto ainda estavam verdes, e podiam-se deformar para acompanharem algumas irregularidades. O resultado é uma vida e uma individualidade que são inteiramente diferentes da execução disciplinada evidente em Prior Park, também de meados dos anos 1700, onde os elementos foram modelados em estuque de Paris e todos eram idênticos entre si. O trabalho é de uma qualidade superior, sendo cada troço igualmente bom, mas todos diferentes no respectivo carácter.

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Em Thrilestane e num grande número de outros castelos Escoceses com tectos executados pelo mesmo grupo de executantes itinerantes, o friso e os enriquecimentos moldados são todos feitos na mesma mistura bem reforçada com crina, rica em cal (aproximadamente uma parte de cal para um quinto de parte de agregado). Estão isentos de gesso e são tão flexíveis que em Carigievar um desses moldados circunda um florão com a raio aproximado de 200 mm.

Apesar da importância de se executar assim, só recentemente existiram tentativas reais para se compreender a natureza e o material que é reparado ou renovado, e um grande número de alterações significativas de percepção e de atitudes aumentou a nossa compreensão sobre esta arte. Muito significativamente, é agora geralmente reconhecido que uma argamassa cumprindo com os British Standards tem pouco em comum com os materiais usados no nosso património edificado, e é evidente que a boa prática vulgarmente aceite na construção está frequentemente muito afastada da boa prática que produziu todas as idiossincrasias dos trabalhos que estamos a tentar conservar. A análise de argamassas é cada vez mais reconhecida como um factor chave no programa de conservação, especialmente na fase anterior ao contrato.

Uma análise ao original é melhor executada como um contrato prévio separado, antes do desenvolvimento de uma especificação para o trabalho, já que o programa e as implicações financeiras do contrato principal impedem  frequentemente que se faça uma investigação rigorosa mais tarde.

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Algumas empresas de conservação de edifícios executam as suas próprias análises em casa e a interacção entre o analista, o estucador e o historiador é crucial.

Há uma tendência crescente para se outorgar um contrato prévio de trabalhos de investigação a empresas especialistas, assim como as especificações consequentes se têm vindo a tornar mais dignas de confiança e se têm vindo a abandonar as cláusulas estandardizadas e as referências às especificações de execução e de materiais dos BS que resultam frequentemente em trabalhos neutros e inadequados, embora tecnicamente conseguidos. Muitas das análises prévias ao contrato contribuíram significativamente para a compreensão e para a datação da cronologia construtiva.

A análise não procura apenas os constituintes dos materiais, mas está preparada para interpretar pistas sobre as técnicas de execução. Os tipos de materiais caem em contextos de geologia, cronologia e alterações sociais. O analista pode, tipicamente, procurar o tipo e a quantidade da crina, a sua presença ou ausência em todas as camadas, incluindo a presa, como as camadas foram arranhadas, onde é que elas foram esfregadas, quanto é que elas retraíram durante a secagem, onde é que as fendas de retracção foram transmitidas através das camadas, e onde é que foram aplicadas camadas verdes sobre  verde, ou verde sobre seco.

Esta informação é indispensável para o principal interesse do analista que consiste em identificar e quantificar o tipo de agregado, a sua granulometria e origem, as proporções entre a cal e o agregado, a presença da adição de gesso, de aditivos hidráulicos ou de constituintes orgânicos, tais como óleos, gorduras ou calos.