Os crimes de perigo têm uma estrutura típica em que o legislador descreve uma conduta típica perigosa e da qual se autonomiza um resultado típico que é o próprio perigo para o bem jurídico que o legislador pretende proteger através da incriminação.
Para que o tipo esteja consumado, é necessário que se autonomize dessa conduta o resultado típico, que é o perigo para a própria vida da pessoa que foi exposta.
Nos crimes de perigo concreto o resultado é o próprio perigo para o bem jurídico que a norma pretende tutelar.
Mas o perigo é uma possibilidade de lesão. Sendo o dolo a consciência e vontade de realização dos elementos objectivos do tipo, nos crimes de resultado de que são exemplo também os crimes de perigo concreto, o resultado é o elemento objectivo do tipo. Logo tem de abarcar o próprio resultado enquanto elemento objectivo do tipo.
Donde, o dolo tem efectivamente de se reportar nos crimes de perigo concreto ao próprio perigo que é o resultado autonomizável da conduta perigosa.
O dolo é uma figura que tem um recorte legislativo. Existem várias modalidades de dolo, que é um dolo de lesão, previstas no art. 114º CP. Portanto o dolo de perigo há-de ser um dolo que não pode ser uma figura inteiramente nova, mas que tem que ter algum apoio legislativo. Há-de ter alguma filiação em sede do que já está no art. 14º CP, nalgum dos seus números.
O dolo de perigo não é compaginável de ser recortado à figura do dolo directo de primeiro grau, ou intenção, prevista no art. 14º/1 CP, porque é difícil conceber que quem actuar querendo o perigo que é a probabilidade de lesão e querendo directamente aquele perigo, pelo menos não se conforma com a possibilidade de lesão.
Por outro lado também não é concebível uma situação de dolo eventual de perigo, porque se o dolo eventual nos termos do art. 14º/3 CP, é aquela situação em que o agente representa como possível que da sua conduta vá ocorrer a lesão e actua conformando-se com essa possibilidade, então o agente, ao prever como possível o perigo, está a prever a possibilidade da lesão, porque o perigo é sempre a possibilidade de lesão.
O dolo de perigo há-de ser natural e necessariamente um dolo necessário de perigo, que pode ser recortado nos moldes do art. 14º/2 CP.
Para que exista dolo de perigo é necessário um elemento positivo e dois elementos negativos.
Elemento positivo:
É a consciência que o agente tem da situação de perigo: o agente tem de representar, tem de tomar consciência (elemento intelectual do dolo) da possibilidade de lesão que é o perigo.
Elementos negativos:
1) É preciso que o agente, tendo previsto e representado o perigo, que é a possibilidade de lesão não se auto-tranquilize no sentido de pensar que aquilo que previu como perigoso não irá ocorrer, porque nesse caso tem-se uma situação de negligência consciente (art. 15º/1 CP).
2) Por outro lado, tendo o agente representado o perigo e tendo consciência desse perigo, ele não se pode auto-conformar. Na verdade, se o agente prevê o perigo e se auto-conforma com a possibilidade de o perigo por ele previsto se desencadear em lesão, então já se tem uma situação de dolo eventual de lesão.
Ainda no que diz respeito à imputação subjectiva, torna-se relevante falar nos elementos subjectivos específicos ou especiais.
Os Neoclássicos chamariam à atenção para o facto de que o tipo tinha alguns elementos subjectivos específicos. Foram referidas em sede própria as especiais tendências, as especiais intenções, a propósito do crime de burla, que pressupunha uma intenção de enriquecimento.
Nestes casos, os tipos só estão preenchidos e constituídos quando se verifica essa intenção ou intenções. No entanto para a consumação material do tipo é necessário que o resultado dessas intenções se concretize.
Quando o legislador nada diz, nos tipos da parte especial que são em geral dolosos, admite-se qualquer forma de dolo – dolo directo, dolo necessário, dolo eventual – a não ser que a lei expressamente limite a forma de dolo que serve para o preenchimento do tipo legal.