Esta causa de justificação vem prevista no art. 34º CP funcionando relevantemente afasta a ilicitude do facto punível.
Quanto ao seu fundamento, assenta já numa ideia de ponderação de interesses entre o bem jurídico ou interesse ameaçado por um perigo e o bem jurídico ou interesse que se sacrifica para afastar esse perigo.
O interesse ou o bem jurídico cujo perigo se afasta tem que ser superior ao interesse sacrificado. Isso diz-se expressamente um dos elementos do direito de necessidade, nomeadamente pela verificação do preceituado do art. 34º-b CP.
A causa de justificação ou de exclusão da ilicitude, designada direito de necessidade ou estado de necessidade objectivo, também dito estado de necessidade justificante (art. 34º CP), precisamente para distinguir do art. 35º CP que prevê o chamado estado de necessidade, também dito estado de necessidade subjectivo ou desculpante:
- Enquanto que o direito de necessidade, ou estado de necessidade objectivo ou justificador é uma causa de exclusão da ilicitude;
- O estado de necessidade “tout court” ou estado de necessidade subjectivo ou desculpante é uma causa de desculpa.
Consequências desta distinção:
Em primeiro lugar, enquanto no art. 34º CP é excluída a ilicitude do facto típico, no art. 35º CP não se exclui a ilicitude do facto típico mas tão só a culpa. É portanto uma causa de desculpa, o facto permanece típico e ilícito.
Se assim é, é possível haver uma situação de legítima defesa perante uma situação de estado de necessidade do art. 35º CP. Já não é possível haver uma situação de legítima defesa face ao art. 34º CP porque este exclui a ilicitude e para efeitos da legítima defesa a agressão tem que ser actual e ilícita. Se o facto está justificado pelo direito de necessidade, contra facto justificado não há justificação.
Por outro lado, há uma importância também relevante porque, partindo da teoria da acessoriedade limitada, não há comparticipação num facto justificado. Ou seja, não se responsabilizam os comparticipantes se o facto imputado estiver justificado. Assim, se o facto praticado pelo autor, o facto principal, for um facto justificado pelo direito de necessidade do art. 34º CP os comparticipantes, virtualmente cúmplices ou instigadores, não terão também responsabilidade jurídico-penal, uma vez que o facto praticado é um facto lícito.
Já o contrário se passa no âmbito do estado de necessidade subjectivo ou desculpante do art. 35º CP porque não há comparticipação num facto lícito, mas já há comparticipação na culpa.
A culpa é um juízo de censura individualizado e pode existir uma causa de desculpa que beneficie um determinado agente e não aproveitar aos demais. Então só beneficia da causa de desculpa quem dela pode aproveitar, já podendo responsabilizar-se criminalmente os comparticipantes a quem essa causa de desculpa não aproveita. É por isso que a teoria se diz de acessoriedade limitada: porque delimita a responsabilidade criminal dos comparticipantes a um facto típico e ilícito praticado pelo autor. Se o facto for típico, mas não for ilícito, já falta um dos requisitos da acessoriedade limitada, portanto, já não há responsabilidade do participante.
As situações do art. 35º CP que têm relevância em sede de culpa (são causas de desculpa) são aquelas em que o agente age numa situação em que não tem uma normal liberdade de avaliação, de determinação e não lhe era exigível que ele adoptasse um comportamento diferente: ou porque está numa situação de flagrante desespero, de medo ou de coacção.
Pode-se então concluir que a superioridade que se exige nos termos do art. 34º CP entre o bem jurídico sacrificado e o bem jurídico ameaçado pelo perigo não se mede em termos de quantidade: a quantidade não implica superioridade qualitativa.