Apontamentos Recorribilidade do Acto

Recorribilidade do Acto

Para que o Tribunal possa receber o recurso contencioso de anulação é necessário que o acto impugnado seja um acto recorrível.

E para que um acto seja recorrível é necessário, que se trate de um acto administrativo externo, definitivo e executório (art. 25º/1 LPTA será inconstitucional por superveniência do art. 268º/4 CRP?).

Significa isto que não são recorríveis:

a)      Os actos que não sejam actos administrativos;

b)      Os actos administrativos internos;

c)      Os actos administrativos não definitivos;

d)      Os actos administrativos não executórios.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem admitido, a título excepcional, a possibilidade de se interpor recurso contencioso destes actos, que embora juridicamente não sejam executórios, de facto foram executados.

Após a revisão constitucional de 89, a supressão da referência a actos definitivos e executórios no actual n.º 4 do art. 268º, abriu caminho a uma orientação doutrinária que, com maior ou menor amplitude, admite que se possa recorrer de actos que não satisfaçam as exigências de definitividade e executoriedade, desde que apresentem a característica da lesividade (de direitos subjectivos ou interesses legítimos).

O DL 134/98 de 15 de Maio, permite o recurso contencioso de actos administrativos relativos à formação da Administração Pública, que prescindindo de qualquer requisito de definitividade e executoriedade, limitando-se a exigir que tais actos lesem direitos ou interesses legalmente protegidos (art. 2º/1).

1. Os Actos Irrecorríveis.

 Segundo o art. 4º /1 do ETAF:

1.1. Estão excluídos da jurisdição administrativa e fiscal os recursos e as acções que tenham por objecto:

a)      Actos praticados no exercício da função política e responsabilidade pelos danos decorrentes desse exercício.

b)      Normas legislativas e responsabilidade pelos danos decorrentes do exercício da função legislativa;

c)      Actos em matéria administrativa dos Tribunais judiciais;

d)      Actos relativos ao inquérito e instrução criminais e ao exercício da acção penal;

e)      Qualificação de bens como pertencentes ao domínio público e actos de delimitação destes com bens de outra natureza;

f)        Questões de Direito Privado, ainda que qualquer das partes seja pessoa de Direito Público;

g)      Actos cuja apreciação pertença por lei à competência de outros Tribunais.

Este preceito legal representa afinal de contas, na linha tradicional do nosso Direito Administrativo, a aplicação concreta dos seguintes princípios:

  • Há recurso contencioso de todos os actos administrativos;
  • Não há recurso contencioso de actos que não sejam administrativos (ressalva a recorribilidade, expressamente ditada pelo ETAF, dos actos administrativos das entidades referidas no art. 26º/1 alíneas b), c) e d))
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2. Impugnação de Actos Administrativos Praticados sob a Forma Regulamentar e Legislativa

Cabe recurso contencioso contra qualquer acto administrativo definitivo e executório ilegal, mesmo que formalmente incluído numa lei, num decreto-lei ou num diploma regulamentar.

3. O Problema dos Actos Políticos ou de Governo

Os actos políticos ou de governo são outra categoria de actos irrecorríveis.

Desde sempre se considerou que há certos actos do poder executivo que, sendo embora actos concretos e porventura ofensivos dos direitos individuais, não devem ser objecto de recurso contencioso de anulação, ainda que ilegais.

Isto porque, os Tribunais Administrativos se destinam a apreciar o contencioso administrativo, e este abrange os litígios emergentes do exercício da função administrativa – e não as questões que surjam do exercício da função política.

O único critério possível, é o das funções do Estado, definidas por um critério material: são actos políticas os actos praticados no desempenho da função política, tal como são actos legislativos os praticados no desempenho da função legislativa, actos administrativos os praticados no desempenho da função administrativa e, enfim, actos jurisdicionais os praticados no desempenho da função jurisdicional.

Deste modo, o problema transfere-se para outro, que é o de saber como se define a função política e em que é que ele se distingue, nomeadamente, da função administrativa.

Algumas categorias de actos políticos ou de governo:

a)      Actos diplomáticos;

b)      Actos de defesa nacional;

c)      Actos de segurança do Estado;

d)      Actos de dinâmica constitucional;

e)      Actos de clemência.

Todos estes actos, são actos característicos da função política: como tais, merecem a qualificação de actos políticos ou de governo e, nessa qualidade, são insusceptíveis de recurso contencioso de anulação, ainda que porventura sejam ilegais.

Os actos administrativos podem ter consequências políticas, mas nem por isso se transformam em actos políticos: só são actos políticos os que correspondem ao conceito de função política.

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É este o critério que deve considerar-se consagrado na lei portuguesa, nomeadamente no art. 4º/1-a do ETAF que considera irrecorríveis “os actos praticados no exercício da função política”.

O critério é pois, um critério objectivo e material: se o acto corresponde a função política é um acto político, se corresponde a função administrativa é um acto administrativo.

O Estado de Direito exige que a categoria dos actos políticos seja reduzida ao mínimo – e, nomeadamente, que não seja alargada para além dos limites específicos da função política.

4. Observações Complementares

Impugnação de um acto tácito: se o particular, por engano, dirige um requerimento a um certo órgão da Administração, mas este está privado do exercício da sua competência porque a delegou, o deferimento ou indeferimento tácito é imputado, para efeitos de recurso contencioso, ao delegado, mesmo que este não tenha sido remetido inicialmente o requerimento (art. 33º LPTA).

Isto significa que o erro de escolha da entidade a quem enviar o requerimento não obsta à formação de acto tácito. O recurso contencioso deve nestes casos ser interposto contra o acto do delegado, e não do delegante.

Acto expresso confirmativo de acto tácito: o acto expresso confirmativo de acto tácito é contenciosamente impugnável, desde que o recorrente, que impugnou o acto tácito, requeira, no prazo de um mês a contar da notificação ou publicação do acto expresso, que este último seja acrescentado ao acto tácito (ampliação do objecto de recurso) ou tome o lugar do acto tácito (substituição do objecto de recurso), art. 51º/1 LPTA.

Cumulação de recursos: o recorrente pode no mesmo recurso cumular a impugnação de dois ou mais actos administrativos recorríveis, desde que eles se encontrem entre si numa relação de dependência ou de conexão (art. 38º/1: o recorrente pode cumular a impugnação de actos que estejam entre si numa relação de dependência ou de conexão LPTA). Esta regra comporta algumas excepções (art. 38º/3: a cumulação e a coligação não são admissíveis:

a)      Quando a competência para conhecer das impugnações pertença a Tribunais de diferente categoria;

b)      Quando a impugnação dos actos não esteja sujeita à mesma forma de processo).