Apontamentos O Direito Administrativo como ramo de Direito

O Direito Administrativo como ramo de Direito

1. Generalidades

A Administração Pública está subordinada à lei. E está também, por outro lado subordinada à justiça, aos Tribunais. Isso coloca o problema de saber como se relacionam estes conceitos de Administração Pública e directa.

Para haver Direito Administrativo, é necessário que se verifiquem duas condições: em primeiro lugar, que a Administração Pública e actividade administrativa sejam reguladas por normas jurídicas propriamente ditas, isto é, por normas de carácter obrigatório; em segundo lugar, que essas normas jurídicas sejam distintas daquelas que regulam as relações privadas dos cidadãos entre si.

2. Subordinação da Administração Pública ao Direito

A Administração está subordinada ao Direito. É assim em todo o mundo democrático: a Administração aparece vinculada pelo Direito, sujeita a normas jurídicas obrigatórias e públicas, que têm como destinatários tanto os próprios órgãos e agentes da Administração como os particulares, os cidadãos em geral. É o regime da legalidade democrática.

Tal regime, na sua configuração actual, resulta historicamente dos princípios da Revolução Francesa, numa dupla perspectiva: por um lado, ele é um colorário do princípio da separação de poderes; por outro lado, é uma consequência da concepção na altura nova, da lei como expressão da vontade geral, donde decorre o carácter subordinado à lei da Administração Pública.

No nosso país encontrou eco na própria Constituição, a qual dedica o título IX da sua parte III à Administração Pública (art. 266º).

Resultando daí o princípio da submissão da Administração Pública à lei. E quais as consequências deste princípio?

Em primeiro lugar, resulta desse princípio que toda a actividade administrativa está submetida ao princípio da submissão da Administração ao Direito decorre que toda a actividade administrativa e não apenas uma parte dela deve subordinar-se à lei.

Em segundo lugar, resulta do mesmo princípio que a actividade administrativa, em si mesma considerada, assume carácter jurídico: a actividade administrativa é uma actividade de natureza jurídica. Porque estando a Administração Pública subordinada à lei – na sua organização, no seu funcionamento, nas relações que estabelece com os particulares –, isso significa que tal actividade é, sob a égide da lei de direitos e deveres, quer para a própria Administração, quer para os particulares, o que quer dizer que tem carácter jurídico.

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Em terceiro lugar, resulta ainda do mencionado princípio que a ordem jurídica deve atribuir aos cidadãos garantias que lhes assegurem o cumprimento da lei pela Administração Pública.

Quanto ao Direito Administrativo, a sua existência fundamenta-se na necessidade de permitir à Administração que prossiga o interesse público, o qual deve ter primazia sobre os interesses privados – excepto quando estejam em causa direitos fundamentais dos particulares. Tal primazia exige que a Administração disponha de poderes de autoridade para impor aos particulares as soluções de interesse público que forem indispensáveis. A salvaguarda do interesse público implica também o respeito por variadas restrições e o cumprimento de grande número de deveres a cargo da Administração.

Não são pois, adequadas as soluções de Direito Privado, Civil, ou Comercial: têm de aplicar-se soluções novas específicas, próprias da Administração Pública, isto é, soluções de Direito Administrativo.

A actividade típica da Administração Pública é diferente da actividade privada. Daí que as normas jurídicas aplicáveis devam ser normas de Direito Público, e não normas de Direito Privado, constantes no Direito Civil ou de Direito Comercial.

Nos sistemas de Administração Executiva – tanto em França como em Portugal – nem todas as relações jurídicas estabelecidas entre a Administração e os particulares são da competência dos Tribunais Administrativos:

  • O controle jurisdicional das detenções ilegais, nomeadamente através do “habeas corpus”, pertence aos Tribunais Judiciais;
  • As questões relativas ao Estado e capacidade das pessoas, bem como as questões de propriedade ou posse, são também das atribuições dos Tribunais Comuns;
  • Os direitos emergentes de contactos civis ou comerciais celebrados pela Administração, ou de responsabilidade civil dos poderes públicos por actividades de gestão privada, estão igualmente incluídos na esfera da jurisdição ordinária.
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Mesmo num sistema de tipo francês, não só nos aspectos mais relevantes da defesa da liberdade e da propriedade a competência contenciosa pertence aos Tribunais Comuns, mas também a fiscalização dos actos e actividades que a Administração pratica ou desenvolve sob a égide do Direito Privado, não é entregue aos Tribunais Administrativos.

O fundamento actual da jurisdição contencioso-administrativo é apenas o da convivência de especialização dos Tribunais em função do Direito substantivo que são chamados a aplicar.

3. Noção de Direito Administrativo

O Direito Administrativo é o ramo de Direito Público constituído pelo sistema de normas jurídicas que regulam a organização, o funcionamento e o controle da Administração Pública e as relações que esta, no exercício da actividade administrativa de gestão pública, estabelece com outros sujeitos de Direito.

A característica mais peculiar do Direito Administrativo é a procura de permanente harmonização entre as exigências da acção administrativa e as exigências de garantia dos particulares.

4. O Direito Administrativo como Direito Público

O Direito Administrativo é, na ordem jurídica portuguesa, um ramo de Direito Público. E é um ramo de Direito Público, qualquer que seja o critério adoptado para distinguir o Direito Público de Direito Privado.

Se se adoptar o critério do interesse, o Direito Administrativo é Direito Público, porque as normas de Direito Administrativo são estabelecidas tendo em vista a prossecução do interesse colectivo, e destinam-se justamente a permitir que esse interesse colectivo seja realizado.

Se se adoptar o critério dos sujeitos, o Direito Administrativo é Direito Público, porque os sujeitos de Direito que compõem a administração são todos eles, sujeitos de Direito Público, entidades públicas ou como também se diz, pessoas colectivas públicas.

Se, enfim, se adoptar o critério dos poderes de autoridade, também o Direito Administrativo é o Direito Público porque a actuação da administração surge investida de poderes de autoridade.