Noção de facto jurídico
É todo o acto humano ou acontecimento natural juridicamente relevante. Esta relevância jurídica traduz-se principalmente, senão mesmo necessariamente na produção de efeitos jurídicos.
A constituição de uma relação jurídica depende sempre de um evento, evento esse a que o Direito reconhece relevância como fonte de eficácia jurídica. A delimitação de facto jurídico é tarefa que cabe ao próprio Direito.
A criação de efeitos jurídicos cabe à norma jurídica. Daí que, os factos jurídicos constituam a caracterização das situações que sob forma hipotética a norma faz depender a produção de efeitos de Direito.
Para o prof. Oliveira Ascensão: a factispécie pressupõe já uma situação juridicamente valorada, a que se ligam ulteriores efeitos jurídicos, para o facto de sobrevir determinado facto jurídico.
Contraposição entre efeito jurídico e facto jurídico
Os factos jurídicos são sempre acontecimentos do mundo real que o Direito toma como causas de certas consequências juridicamente atendíveis. Os efeitos jurídicos serão as consequências desses factos jurídicos.
É corrente estabelecer a distinção entre factos naturais, tem a sua origem num acontecimento da natureza; humanos, tem a sua origem na vontade humana.
Classificação dos factos jurídicos
A primeira classificação dos factos jurídicos é a que se pode estabelecer entre factos voluntários ou actos jurídicos, resultam da vontade como elemento juridicamente relevante, são manifestação ou actuação de uma vontade; são acções humanas tratadas pelo direito enquanto manifestação de vontade. Os factos jurídicos involuntários ou naturais, são estranhos a qualquer processo volitivo – ou porque resultam de causas de ordem natural ou porque a sua eventual voluntariedade não tem relevância jurídica.
Classifica-se, os factos humanos em voluntários, e os factos naturais em extraordinários/involuntários.
Mas, há factos humanos não voluntários, porque a vontade do Homem não é determinante nem na sua produção nem nos efeitos que lhes são correspondentes (análise casuística dos efeitos que a norma lhes atribuí, excepto o decurso do tempo – art. 276º CC).
Os factos jurídicos humanos (caracterizam-se por acções que atingem um determinado fim) podem também ser, não voluntários, integrando-se estes naqueles comportamentos caracterizados por se dirigirem a um fim que o Homem mentalmente antecipa e quer realizar.
No entanto, nem sempre o Direito atende a esta estrutura finalista de acção humana. Há factos em relação aos quais, o seu carácter humano é volitivo (voluntário) é completamente desconsiderado pelo Direito na atribuição de quaisquer fins, e tudo acaba por se passar como se de um acto natural se tratasse.
Os factos jurídicos não voluntários, no seu conjunto, formam uma categoria a que muitos autores designam por facto jurídico strictu sensu, contrapondo-se a esta a de actos jurídicos correspondentes aos factos jurídicos voluntários.
Acto jurídico
É uma manifestação de vontade e que como tal, a norma atribuí efeitos de Direito. Nos diversos actos humanos existe sempre uma manifestação de vontade, sendo que esta é o elemento relevante do acto jurídico, que é entendida e considerada pelo direito.
O prof. Castro Mendes, diz que só estamos na presença de um acto jurídico quando pensamos num facto voluntário a que a Ordem Jurídica liga efeitos de Direito, em atenção à sua voluntariedade.
A simples conjugação destes elementos permite a formulação de actos jurídicos, entendendo-se aqui, a manifestação de vontade como tal, a norma jurídica atribuí efeitos de Direito.
Classificação
A classificação dos actos jurídicos obedece a diferentes critérios. Assim, no que toca à estrutura do acto, distingue-se acto jurídico simples e acto jurídico complexo. Se atendermos à modalidade dos efeitos, distingue-se entre actos positivos e actos negativos, actos principais e actos secundários, e actos lícitos e actos ilícitos.
O papel que é reservado à vontade na formulação dos efeitos do acto, permite-nos ainda fazer a distinção entre actos jurídicos simples ou não intencionais, e actos jurídicos intencionais. Os actos intencionais serão de conteúdo determinado e de conteúdo não determinado ou indeterminado.
No acto intencional de conteúdo determinado, o conteúdo da manifestação de vontade está pré-determinado, ficando assim definindo o efeito do acto.
Actos simples e actos complexos
Atendendo-se ao critério da estrutura, definir-se-á como acto simples, aquele que é formado por um só elemento. Relativamente ao acto complexo e em antinomia ao acto simples, tem-se a destacar diversos elementos:
- Os actos jurídicos complexos há que estabelecer a distinção consoantes se produzem os seus elementos constitutivos;
- Os elementos, quando ocorrem todos a um tempo, definem um acto complexo de formação instantânea ou simultânea.
Actos complexos de formação sucessiva ou plurissubsistente, os vários elementos de um acto complexo acabam por se produzir em tempos diferentes, havendo no entanto um tempo intermédio entre cada declaração de vontade o que se tornará relevante em termos jurídicos.
Actos jurídicos positivos e negativos
Estes actos, situam o critério de distinção no plano dos efeitos jurídicos do acto e atendendo-se ao modo como eles se projectam sobre uma situação jurídica existente no momento da sua prática.
Os actos positivos, consistem sempre em acções, num facere. Em certas situações, também se pode considerar a omissão, um non facere, conducente à manutenção de um estado de coisas anterior.
Actos jurídicos principais e secundários
Esta disposição prende-se muito com a eficácia do acto, da própria relevância do acto jurídico como autêntica fonte criadora de factos jurídicos.
Os factos a que a Ordem Jurídica liga efeitos jurídicos, são factos principais. Se atendermos à modalidade dos efeitos que produzem, os actos principais podem agrupar-se em certas classificações:
– Actos constitutivos;
– Actos modificativos;
– Actos extintivos;
– Actos aquisitivos modificativos dispositivos de direitos, o facto adstritos em relação à esfera jurídica de outra pessoa (ex. 342º CC).
Os actos secundários em si mesmos, não são causas de efeitos. No entanto, interferem com eficácia dos actos principais, impedindo ou confirmando essa mesma eficácia. Neste sentido, dizemos que estamos perante actos impeditivos, permissivos ou confirmativos de actos principais.
Actos jurídicos lícitos e ilícitos
O critério de distinção é o de conformidade com a lei, projectando-se esta distinção igualmente no regime dos efeitos jurídicos do acto, é uma distinção privativa dos actos jurídicos.
A razão de ser desta delimitação reside na circunstância de a ilicitude envolver sempre um elemento de natureza subjectiva que se manifesta num não acatamento, numa rebeldia à Ordem Jurídica instituída. Envolve sempre uma violação da norma jurídica, sendo nesse sentido a atitude adoptada pela lei a repressão, desencadeando assim um efeito tipo da violação – a sanção.
Os actos ilícitos, são contrários à Ordem Jurídica e por ela reprovados, importam uma sanção para o seu autor (infractor de uma norma jurídica).
Os actos lícitos são conformes à Ordem Jurídica e por ela consentidos. Não podemos dizer que o acto ilícito seja sempre inválido. Um acto ilícito pode ser válido, embora produza os seus efeitos sempre acompanhado de sanções. Da mesma feita, a invalidade não acarreta também a ilicitude do acto.
A distinção entre actos jurídicos simples ou não intencionais ou calculados, não põe em causa o problema da intervenção da vontade, não obstante se atenda à relevância da vontade no regime dos efeitos jurídicos do acto.
Há certos actos jurídicos que bastam com a vontade do agente, dirigida a uma conduta em si mesma. Esta conduta, tem no entanto de ser querida pelo agente e necessita sempre de uma acção humana – sendo esta apta e suficiente para que se produzam os efeitos previstos na forma jurídica.
Os actos jurídicos intencionais, podem distinguir-se entre determinados e indeterminados. Há nestes actos jurídicos aquilo a que alguns autores chamam: a nota finalista da conduta humana.
Na modalidade dos actos jurídicos intencionais é possível distinguir-se a vontade humana, sendo que esta é considerada para o direito, como a génese da voluntariedade de determinar Direito – vontade expressa de uma certa acção. Noutros casos para além dessa voluntariedade, atende-se também ao facto de o agente querer expressar uma determinada conduta de pensamento.
A vontade funcional encontra-se sempre nos actos intencionais, não tendo no entanto em todos eles a mesma extensão, processando-se a distinção nos termos seguintes. Em certos actos jurídicos intencionais, a vontade, embora se refira aos efeitos do acto, não estipula esses efeitos. O agente tem de acatar os efeitos não patrimoniais do casamento. Não são, neste caso, os nubentes que definem os efeitos não patrimoniais do acto. Os efeitos do acto indeterminado, não são fixos tão só pela norma jurídica, como também pelo agente.
Nem a norma nem o agente determinam os efeitos do acto em termos absolutos. A norma confere uma certa liberdade ao agente na determinação dos efeitos.
Factos voluntários ou actos jurídicos
Estes podem, segundo outra classificação de caracter fundamental, distinguir-se em negócios jurídicos e simples actos jurídicos ou actos jurídicos “sirito sensu”. Estamos no domínio dos factos voluntários, apesar disso nem sempre os efeitos jurídicos respectivos são produzidos por terem sido queridos e na medida em que o foram.
Os negócios jurídicos, são factos voluntários, cujo núcleo essencial é integrado por uma ou mais declarações de vontade a que o ordenamento jurídico atribui efeitos jurídicos concordantes com o conteúdo da vontade das partes, tal como este é objectivamente (de fora) apercebido.
Os simples actos jurídicos, são factos voluntários cujos efeitos se produzem, mesmo que não tenham sido previstos ou queridos pelos seus autores, embora muitas vezes haja concordância entre a vontade destes e os referidos efeitos. Os efeitos dos simples actos jurídicos ou actos jurídicos “sirito senso” produzem-se “ex. lege” e não “ex. voluntate”.
Dentro dos simples actos jurídicos é usual fazer-se uma distinção entre:
a) Quase-negócio jurídicos ou actos jurídicos quase-negócio, traduzem-se na manifestação exterior da vontade (ex. art. 471º Código Comercial – art. 808º CC);
b) Operações jurídicas, também designada na doutrina estrangeira pelas expressões actos materiais, actos reais ou actos exteriores, traduzem-se na efectivação ou realização de um resultado material ou factual a que a lei liga determinados efeitos jurídicos.