Desde, pelo menos, 1809, ano em que M. Chaptal publicou as suas investigações sobre os pigmentos utilizados nas pinturas murais de Pompeia, a análise química feita com o recurso a testes de coloração e solubilidade tem sido utilizada até hoje com o objectivo da identificação dos pigmentos presentes numa pintura. Consistem tais testes em fazer reagir diversas soluções com um pigmento, de uma forma ordenada, e observar se ocorrem mudanças de cor ou se o pigmento se dissolve ou, pelo contrário, se a partir da solução a que deu origem se forma um sólido (precipitação) e, neste caso, registar a forma das partículas que o constituem. Por exemplo, se a adição de ácido clorídrico a um pigmento dá origem à rápida dissolução deste acompanhada de efervescência, ou seja a libertação de uma substância gasosa, podemos concluir que o pigmento em causa quimicamente é um carbonato. Neste caso, se o pigmento é azul, trata-se de azurite, se é verde, malaquite, se é branco, cré.
Actualmente, estes testes são normalmente conduzidos num microscópio, recorrendo a minúsculas quantidades de matéria cromática recolhida de uma pintura com o auxílio de um bisturi e utilizando apenas uma gota de cada um dos reagentes. Nestas condições são geralmente designados por testes microquímicos.
Perante um pigmento desconhecido, há duas formas de abordagem: através de reacções independentes que propositadamente são realizadas com o objectivo de testar a presença de um determinado pigmento, que, pelas propriedades ópticas, se suspeita fazer parte da amostra a analisar, ou através de um conjunto sequencial de reacções que vão sendo efectuadas sem antecipadamente nada se supor acerca da constituição da amostra, reacções estas que, à medida que se avança no esquema analítico, vão limitando o número dos possíveis pigmentos até que, idealmente, se chega à situação em que apenas é possível um.
Em princípio, para cada pigmento é possível indicar uma ou duas reacções características, as quais são devidas aos iões que fazem parte da estrutura cristalina apresentada por quase todos os pigmentos. Por exemplo, no referido caso da azurite, que é um carbonato de cobre, é possível testar a presença do ião carbonato (o que pode ser feito através da mencionada reacção com o ácido clorídrico) e a presença do ião cobre (II).
Graças ao trabalho de sistematização de Joyce Plesters, desde 1956 que está publicado um conjunto de reacções químicas características de cada um dos diferentes pigmentos utilizados em pintura, reacções estas que, não obstante outras contribuições posteriores, nomeadamente as que se encontram recolhidas no conjunto de monografias dedicadas aos mais importantes pigmentos, cuja publicação foi iniciada, em 1966, por Rutherford Gettens nas páginas da revista Studies in Conservation, de que actualmente estão editados três volumes, ainda hoje continuam a ser muito utilizadas nos laboratórios onde se procede à identificação de pigmentos por testes microquímicos. Quanto aos esquemas analíticos para uma análise sistemática, dispõe-se daqueles que foram elaborados pelo mesmo Gettens e por George Stout para os principais pigmentos brancos, azuis e verdes, publicados em 1936.
Se o facto de a abordagem sistemática não implicar nenhuma pista inicial acerca do pigmento a identificar pode sugerir ser esta a metodologia mais vantajosa, também é verdade que desta forma é geralmente necessário realizar um número de operações bastante superior aquele que é requerido na situação em que directamente se procede a um teste com o objectivo de averiguar a presença de um certo pigmento. O facto de neste caso ser indispensável haver a suspeita de qual é esse pigmento, ao contrário do que apressadamente se possa supor, não constitui obstáculo, já que a prévia observação ao microscópio da amostra a analisar normalmente permite recolher um série de informações relacionadas com a cor, dimensão, forma e transparência das partículas que constituem o pigmento que geralmente são suficientes para um observador treinado elaborar um bom ponto de partida. Por exemplo, um pigmento azul, de tonalidade ligeiramente esverdeada, formado por partículas de dimensões relativamente avultadas, transparentes e arredondadas é, provavelmente, azurite. Se as partículas forem igualmente grandes e transparentes, mas o azul não apresentar essa contribuição esverdeada e se em vez de formas arredondadas forem observadas formas angulosas, então tratar-se-á, muito possivelmente, de esmalte – um dos raros pigmentos que não tem uma estrutura cristalina, sendo, pelo contrário, um vidro.
Contudo, na prática, podem surgir algumas dificuldades.
Em primeiro lugar, sucede que exclusivamente através destes testes de natureza química, por exemplo, não é possível distinguir a azurite da malaquite, que é também um carbonato de cobre, mas verde. Se neste caso a cor das partículas permite resolver o dilema, o mesmo não se passa com o branco de titânio. Este é um pigmento, de cor branca como o nome sugere, que começou a ser utilizado em pintura cerca de 1920, do qual existem duas variedades que, mineralogicamente, correspondem a anátase e a rútilo. Estas duas variedades do pigmento são quimicamente iguais, qualquer uma delas correspondendo a óxido de titânio (TiO2), distinguindo-se apenas pela posição assumida pelos iões na estrutura cristalina de que fazem parte. Como as suas propriedades químicas são semelhantes, designadamente a sua composição elementar, não é possível distinguir as duas variedades de branco de titânio através de testes de natureza química.
Neste contexto, importa referir que quando um pigmento existe sob uma forma natural e outra sintética os testes microquímicos, de um modo geral, também não permitem distinguir essas duas variedades em virtude de, no essencial, terem a mesma composição química.
Um outro problema, talvez menos frequente, mas provavelmente mais grave porque mais imprevisível, é o que resulta do facto de só ser possível identificar pigmentos que constem do esquema de análise sistemática adoptado ou, no caso de ser seguida outra metodologia, para o qual especificamente seja realizado um teste. Uma interessante ilustração deste problema é proporcionada pelo pigmento actualmente designado como amarelo de chumbo e estanho. Sabe-se hoje que este material, usado desde a Idade Média, foi especialmente importante nos séculos XV, XVI e inícios do século XVII, época em que era designado por massicote no Norte da Europa e por giallolino ou giallorino no Sul, particularmente em Itália, e sabe-se também que deixou de ser empregue depois de 1750, ocasião em que caiu no esquecimento de pintores e tratadistas.
A partir desta data, as referências a massicote correspondem a um outro pigmento amarelo, presentemente identificado como amarelo de chumbo, que, de acordo com o conhecimento actualmente disponível, sempre teve uma utilização muito limitada. As análises feitas a amostras recolhidas em pinturas antes de 1941, análises estas realizadas através de testes microquímicos, contudo, tinham conduzido sempre à conclusão que o amarelo de chumbo era um pigmento utilizado em muitas pinturas e, mais ainda, era o pigmento amarelo com maior preferência em determinada época. Só em 1941 foi detectado o erro por R. Jacobi, no Instituto Döerner, em Munique, e percebeu-se então que a maior parte das referências ao amarelo de chumbo encontradas nas análises anteriores a essa data deveria corresponder a amarelo de chumbo e estanho.
Como fora possível repetir-se o mesmo erro em tantas análises, conduzidas em laboratórios tão diferentes? Hoje é fácil explicar a situação: como até esse momento era conhecido apenas um pigmento amarelo contendo chumbo, não se sabendo da existência de nenhum pigmento dessa cor simultaneamente contendo chumbo e estanho, nas análises para a identificação de pigmentos amarelos, quando havia razões para isso, procedia-se somente a um teste que permitia verificar se o chumbo fazia parte ou não da composição do pigmento. Se o teste ra positivo, o desconhecimento de qualquer outro pigmento amarelo contendo chumbo levava naturalmente à conclusão de que era amarelo de chumbo o pigmento desta cor presente na amostra, obviamente não sendo realizado nenhum teste para outro elemento, como o estanho. Só a utilização de outros métodos permitiu em 1941 dar conta de um pigmento de que ninguém suspeitava.
Comparado com outros métodos actualmente disponíveis, a análise microquímica surge também como um método moroso e que implica a recolha de amostras na pintura, ainda que de diminutas dimensões.
Em contrapartida, os testes microquímicos apresentam algumas vantagens significativas onde provavelmente radicará o facto de, quase após dois séculos de utilização, continuarem a ser muito usados nalguns laboratórios.
A principal vantagem, possivelmente, é a que resulta das reduzidas exigências de equipamento e mínimos custos de funcionamento. Com efeito, para além do microscópio óptico, necessário somente por causa da pequena dimensão das amostras de que normalmente é possível dispor, é suficiente algum material de vidro, comum em qualquer laboratório de química, e um conjunto de reagentes que, se necessário, pode em parte ser adquirido numa drogaria.
Em termos de recursos humanos as exigências também são escassas, pois, de uma forma geral, a análise envolve apenas a aplicação de uma série de procedimentos relativamente simples previamente estabelecidos. Trata-se, portanto, de um método que, inclusivamente, pode ser facilmente implantado num atelier de conservação, razão pela qual estão disponíveis no comércio da especialidade kits com instruções, material de vidro e alguns reagentes para a identificação dos principais pigmentos utilizados em pintura.
Uma outra vantagem apresentada pela análise microquímica é a possibilidade de ela se estender a qualquer material, independentemente, por exemplo, da sua composição química ou da sua estrutura.
Assim, o método é aplicável à identificação dos corantes utilizados em pintura e pigmentos não cristalinos.
Uma terceira vantagem é a que resulta da fácil conjugação deste método com a descrição estratigráfica que é possível fazer a partir das amostras recolhidas. Com efeito, a análise microquímica é habitualmente realizada após a observação ao microscópio de uma amostra disposta transversalmente numa matriz de uma resina sintética, observação que permite determinar o número de camadas de tinta utilizadas na pintura de um determinado motivo, a espessura e o número de diferentes pigmentos de cada uma das camadas, a cor, dimensão, forma e transparência das partículas de cada um dos pigmentos, e outros aspectos que igualmente possam parecer relevantes.
Nestas circunstâncias, estas observações da estratigrafia — que rigorosamente nada têm que ver com a análise microquímica, embora, seja frequente alguma confusão entre os dois métodos — são realizadas com uma parte da amostra, sendo reservada para a análise química a outra parte, que é separada nas diferentes camadas identificadas. Nalguns casos, contudo, é possível realizar os testes microquímicos directamente sobre os cortes transversais. Já agora, convém referir também que embora a preparação das amostras para observação da estratigrafia seja normalmente realizada utilizando mais algum equipamento, designadamente uma polidora que permite expor à superfície da resina um corte transversal da amostra, é possível seguir procedimentos simplificados que evitam esse equipamento.