Existe uma pedreira de calcário no Condado de Kerry, no Sudoeste da Irlanda, perto da aldeia de Lixnaw, que em gaélico se chama de Leac Snámha, o que significa “a bandeira de pedra nadadora”.
Recentemente tive o prazer de dirigir aí um “workshop” sobre as técnicas de construção tradicional de paredes em pedra e sobre argamassas de cal. “Pedras nadadoras” é uma expressão que eu já tinha encontrado antes do curso sobre construção de paredes em pedra.
Nós normalmente não entendemos a flutuação e as pedras como tendo qualquer relacionamento entre si, a não ser que nos estejamos a referir ao nível de competência que um determinado nadador possa ter.
No entanto, aqui não estamos a falar sobre potenciais campeões olímpicos mas apenas sobre pedras em paredes de edifícios recentemente construídas, que parecem andar um pouco a nadar.
Na Irlanda não é preciso que nos digam que chove quase todos os dias no Inverno, e também na Primavera, no Verão e no Outono.
E quando não está a chover, o tempo está frequentemente bastante húmido.
Surgem problemas quando se constróem paredes argamassadas com pedras molhadas, já que passado pouco tempo as pedras dos níveis inferiores começam a nadar um pouco. Isso pode ser ignorado durante algum tempo e pode-se progredir no trabalho de assentamento de novas pedras por cima, mas não por muito mais tempo.
As pedras nadadoras evoluem de um vulgar chapinhar “à cão” para uma robusta braçada Australiana.
Nesta altura fazem-se tentativas para levar estas pedras nadadoras, situadas nas camadas inferiores, de volta aos seus lugares, mas elas não estão nessa disposição, e tudo o que acontece é que elas começam a conseguir uma grande versatilidade na sua recentemente descoberta liberdade.
Parece que elas ficam a gostar de nadar logo que aprendem e não querem parar de maneira nenhuma. Nesta altura é frequente rezarem-se orações do género – por favor não caias, por amor de Deus – mas não, elas não querem aceitar esta humilhação patética nem por um só instante.
Qualquer pessoa que seja suficientemente estúpida para as ter assentado, tem que sofrer as devidas consequências.
Construírem-se paredes em pedra é de uma perversidade inacreditável; por vezes, os nossos erros, em vez de levarem séculos para se manifestarem, quando já se está a salvo, longe e esquecido, caem-nos subitamente em cima da cabeça.
É sempre reconhecível a primeira pedra que se começou a mover, aquela que era ligeiramente desequilibrada, ou a tal que não era tão espessa no topo como na base, especialmente a que não foi devidamente assente com a sua maior dimensão para dentro da parede.
Ela vem ter connosco rápida como um relâmpago; já sabíamos que ela era uma desordeira desde o início, mas por pressa, ou por preguiça, ou seja lá pelo que for, arriscamo-nos esperand que tudo corresse pelo melhor. Não se consegue enganar as pedras; elas já andam por aí há muito mais tempo do que nós.
Muitos de nós que já construímos paredes de pedra argamassada, já experimentamos isto (felizmente cada vez menos, conforme envelhecemos); é ao mesmo tempo vergonhoso e dispendioso porque a única resposta é desmanchar o trabalho e começá-lo de novo. Se não fizermos isto, e fingirmos que o problema não existe, então pode ser que tenhamos que saltar muito rapidamente, para sairmos da frente e não sermos enterrados debaixo do nosso erro.
Tenho ouvido dizer que não se deve trabalhar com pedras molhadas, e que, de qualquer forma, os pedreiros do passado paravam de trabalhar entre o fim do Outono e o princípio da Primavera, voltando para o quentinho das suas casas, tal como qualquer pessoa razoável faria num clima tão frio e húmido.
Possivelmente as pedras flutuantes sabem isto melhor do que nós e tentam saltar para fora das paredes e chegar a casa antes que nós, sei lá.
Sabemos que as pedras molhadas contribuem para esta natação, mas também o fazem as argamassas modernas baseadas em areia e cimento; não são trabalháveis se estiverem secas, e escorrem água muito facilmente se estiverem molhadas, arrastando o cimento pela face do trabalho abaixo, e provocando o aparecimento de manchas. Também provocam outros problemas que não queria tratar aqui.
Argamassas secas, rijas são parte da resposta para a questão, mas elas são muito difíceis de trabalhar para os nossos pulsos.
Tudo isto é ultrapassado pela utilização de uma argamassa tão velha como o próprio tempo, nomeadamente uma argamassa quente de cal.
A argamassa quente de cal é constituída pela mistura de cal viva com areia (geralmente areia grosseira para trabalho tosco) juntamente com água, donde resulta uma reacção térmica na areia, proveniente da cal viva, e temperaturas bastante elevadas (Nota: é um procedimento perigoso que exige prática e a tomada de precauções de segurança antes de ser tentado).
Pensa-se geralmente e aceita-se que é melhor prática deixar que este material “azede” (expressão Irlandesa que significa deixar repousar a areia e a cal cobertas com água) durante um período de meses, antes de ser usado, mas será que no passado isto era sempre feito assim? Penso que não. É possível misturar-se e usar-se a argamassa ainda em quente e em estado plástico para que se possa espalhar com facilidade.
A pedra é assente e num curto período de tempo, consequente da evaporação provocada pelo calor, a argamassa endurece naturalmente e as tais pedras molhadas sentem muito maiores dificuldades se quiserem começar com os seus diabólicos movimentos.
É uma argamassa bastante primitiva, como muitos de nós concordarão, mas é uma argamassa excepcional para ser usada, já que se agarra rapidamente a tudo, inclusive às superfícies verticais das pedras, o que é um elemento crucial para o seu bom rejuntamento.
As paredes tradicionais em pedra eram sólidas e geralmente com espessuras de 2 pés (0,60 cm) para cima. Com argamassas não hidráulicas e paredes espessas, a evaporação da água de amassadura era mais importante do que a carbonatação.