O Estado de Gaza, também conhecido como império de Gaza, abrangia no seu apogeu toda a área costeira entre-os-rios Zambeze e Maputo e tinha a sua capital em Manjacaze na actual província Moçambicana de Gaza. Foi fundado por Sochangane, também conhecido por Manicusse (1821-1858) como resultado do M´fecane.
Havia um grande número de chefaturas e de reinos com agregados populacionais entre três e vinte mil habitantes e cujos chefes tinham um nível de vida superior ao da população, devido aos tributos que dela recebiam. Uma grande parte da África Austral, conheceu uma estrutura política semelhante.
Esta situação modificou-se como resultado de um período de lutas e de transformações políticas conhecidas por M’Fecane que tiveram lugar numa região a que veio a ser conhecida por Zululândia. Importa referir que este período de lutas e de transformações políticas foi seguido de um extenso movimento de emigrantes Ngunis. Estas migrações que ocorreram por volta da segunda metade do século XVIII, tiveram como causas:
- O crescimento da actividade comercial com a baia de Maputo (os Ngunis exportavam marfim e importavam missangas e outras especiarias), provocando conflitos inter-linhagens para o controlo das rotas comerciais ao longo do litoral e para o interior.
- Nos finais do século XVIII e princípios do século XIX, os conflitos foram agudizados por uma crise ecológica, pois que seguiram-se sucessivos anos de seca e fome. Esta crise teria feito oscilar a estabilidade agropecuária anterior, intensificando os conflitos inter-linhagens para o controlo dos recursos económicos mais favoráveis para a agricultura e para a pastorícia.
Durante as lutas, o número dos reinos tendia a diminuir e entre 1810-1815, tinha-se destacado dois principais reinos: o reino de Nduandue, chefiado por Zuide e o reino de Mtetua chefiado por Dingsuayo. Os outros ou tinham desaparecido ou se tinham tornado vassalos destes dois principais reinos.
O exército destes reinos era formado por jovens da mesma idade recrutados dos reinos vassalos. As promoções destes jovens dependiam do desempenho de cada um ou do prestígio da sua família. Entre 1816-1821, estes dois reinos entraram em conflitos culminando com a derrota e morte de Dingsuayo, rei de Mtetua. Com a morte do rei Dingsuayo um dos seus chefes militares Shaca tomou o poder entre 1818-1828, sendo este da linhagem Zulu e ficando o reino conhecido por Zulu.
Após um novo confronto sob tutela de Shaca, o reino Mtetua alcançou a victória. Assim, uma parte dos Nduandue submeteu-se ao vencedor e outra entre 1820-1821 refugiou-se em terras fora do alcance imediato de Shaca.
Entre os emigrantes encontravam-se Zuangedaba, Ngaba Msane, Nguana Maseko e o Sochangane. Este último é que veio a se fixar na região onde se formou o estado de Gaza. O Sochangane fundador, se tornou o primeiro rei de Gaza entre 1821-1858. Ele conseguiu efectuar várias conquistas através de uma política de assimilação dos povos locais. O poder do Estado de Gaza aumentou na medida que aumentavam os súbditos. O rei de Gaza vendia marfim que recebia como tributo e pronunciou-se contra a exportação clandestina de escravos.
O espaço geográfico ocupado pelo Estado de Gaza correspondia as actuais províncias moçambicanas de Gaza, Inhambane, Maputo, Manica e Sofala, habitado por vários grupos étnicos como os Tsongas, Chopis, Bitongas, Ndaus, Shonas e a população mista goesa-portuguesa, resultante dos prazos.
Depois da morte de Sochangane, subiu ao trono, o seu filho Maueue. Este novo rei no sentido de aumentar o seu património, resolveu atacar os seus irmãos, hostilizou os seus vassalos e alguns povos vizinhos, criando um grande número de inimigos internos e externos, pois atacava os caçadores de elefantes que vinham de Lourenço Marques. Em 1861, uma coligação formada por descontentes da aristocracia Nguni e por algumas populações do vale do Inkomati e por alguns comerciantes de Marfim, interessados na caça ao elefante decidem apoiar Mzila, irmão mais velho de Maueue. Depois de um longo período de guerras que se prolongou até 1864, Mzila sai vitorioso.
Em 1862, a capital de Gaza é transferida para Mossurize, ao norte do rio Save, nas vertentes orientais de Chimanimani, onde Ngungunhana filho de Mzila ascendeu ao poder, já em 1884. A mudança da capital para Mossurize, deve-se a instabilidade da região entre a Baia de lagoa e Swazilândia por causa da fome e uma forte epidemia de varíola como consequência da guerra civil.
Novamente a capital de Gaza é transferida para Mandlakazi (grande força), actual Manjakaze em 1889. Uma das razões da mudança da capital teria sido de evitar pressões de Manica, pois os portugueses e os ingleses queriam recomeçar a mineração do ouro. Outro factor teria sido o facto de que o vale do Limpopo e as zonas vizinhas possuíam todos os recursos que já começavam a escassear em Mossurize. Este praticava a caça e a pesca. Praticavam a agricultura, cultivando a Mapira, Mexoeira, Milho e a Mandioca, para além da criação do gado bovino. Todos os reis de Gaza fixavam as suas residências em zonas adaptadas a criação de gado Bovino e à Cultura de Milho.já antes da vinda dos Ngunis, as zonas montanhosas de Mossurize eram conhecidas pelo seu gado bovino.
Tanto nas sociedades satélites, como no núcleo central Nguni do Estado, existia uma nítida divisão em classes sociais. O núcleo central encontrava-se no topo uma alta aristocracia de elementos da linhagem do rei (descendentes do avô ou do bisavô paterno do rei), depois uma média aristocracia composta por Nguni de menor categoria e ainda uma camada de assimilados, muitos dos quais tinham sido originariamente cativos de guerra. Estes últimos eram designados por cabeças (Tinhloko). As mulheres e raparigas capturadas eram dadas como esposas a Nguni sem que os maridos tivessem de pagar o Lobolo.
Porém, a estrutura política de Gaza, era administrada pelo rei, com o auxílio da rainha, conselheiros, família real, governadores provinciais e dos comandantes militares. No Estado de Gaza, o imperador acumulava todos os poderes, dividia o império em capitais que serviam de templos, tribunais, cemitérios, fortalezas, quartéis e escolas de recrutas, dirigidas pelo próprio rei que passava a receber o título de Inkosi. As pessoas imprtantes da capital erm a rainha (Inkosikasi) e o governador (Hossana).
O território do Inkosi encontrava-se dividido em provínciasn chefiadas por governadores (Hossana) cujas funções eram: nomear os indunas, resolver os litígios, mobilizar os regimentos, manter a ordem e cobrar o tributo.
As províncias por sua vez subdividiam-se em distritos chefiados por Induna, nomeado por Hossana, cuja função era a indicação da área a ser ocupada pela povoação familiar (o Muti), chefiada por Mununusana.
O estatuto de cativo não era hereditário, mas as guerras e as acções punitivas constantes, no interior fizeram com que houvesse sempre um bom número de cativos nas unidades domésticas Nguni. Sobre os cativos recaiam muitas tarefas produtivas, como o cultivo dos campos dos aristocratas Nguni, a pastagem do gado, o corte e transporte de lenha. As populações não integradas na estrutura dominante tinham a designação Tonga.
O exercício do poder real, entre os Ngunis não estava dissociado do exercício das cerimónias mágico religiosas. Todos os anos o rei chefiava alguns rituais ligados ao ciclo agrário. O mais importante destes rituais celebrava-se em Fevereiro e era determinado pelo aparecimento dos primeiros frutos. Era o Nkwaya (Incuala). O Incuala tinha a função de libertar as tensões sociais e transformava-se em factor de unidade e de prosperidade.
Factores que constituíram fortaleza, habilidade que fez com este Estado se mantivesse independente foram:
- A existência de maior número de habitantes nos finais do século XIX, criando obstáculo para os portugueses;
- O centralismo do Estado e o reforço do poder local, pois que este Estado elegia indivíduos da confiança do rei para administrar os Estados distantes;
- A mobilização constante dos súbditos num exército permanente, constituído por indivíduos da mesma idade designados regimentos (Butakas) que aprendiam as tácticas de guerra e os usos e costumes dos Ngunis. Esta aprendizagem ia até aos seus 50 anos.
Debilidades do Estado
- O Estado de Gaza foi um estado que resultou de uma conquista militar e era contestado com os grupos étnicos submetidos no estado;
- A irritação do clã real por causa do intenso favoritismo de Ngungunhana em relação a muitos grupos não Ngunis, que passaram a ocupar cargos importantes o que era contestado. Isto criou um certo descontentamento dos grupos Angunis;
- Esclerose da táctica militar, visto que Ngungunhana mantinha-se a carga com o seu exército empenhando a zagaias, enquanto do outro lado, estavam homens armados. Estes foram alguns aspectos que contribuíram para a decadência do Estado de Gaza.